sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Playboyzinhos e maloqueiros.


No dia primeiro deste mês, Luciano Huck fez um “desabafo” na Folha de São Paulo sobre o assalto que havia sofrido, onde levaram seu rolex.

Não é o assunto mais importante do dia, tampouco extraordinário, mas um assaltado na megalópole São Paulo.

Porém, este ocorreu na região dos Jardins, com alguém “notório”. Foi o suficiente para a mais nova guerra no painel do leitor da Folha. Há três dias esta matéria tem repercutido mais do que o resto das matérias da edição juntas.

Aqueles que criticam a atitude de Huck por “choramingar” o rolex roubado, de ter o gélido 38 encostado a cabeça e somente após tudo isso levantar um grito por segurança, são os que mais apareceram.

Estes foram taxados de petistas, como se achar que a atitude de uma celebridade que até ontem não ligava para o fato de a população estar à mercê da violência.

Eles têm razão, pois é real, Huck continua sem se importar, assim como seus iguais, os moradores da região dos Jardins, a elite deste país, o pessoal do cansei; todo esse povo não se importa, na realidade, com nada. É que “a água bateu na bunda”.

Quando a violência chegou aos jardins, quando levaram o seu rolex, quando você sentiu o que é ser assaltado, é ai que você se toca na coisa terrível que é sofrer violência. Neste momento a alta casta vai se preocupar com a violência. Mas só enquanto a periferia não saltar de volta para a escuridão de onde veio.

Luciano não tem culpa de ter nascido “abençoado” com oportunidade e possuir bens materiais, ter uma excelente condição social. Não enriqueceu por meios ilícitos. A sua culpa é a falta de conhecimento da realidade em que vive, de ficar enfurnado em um cenário de sombra e água de coco, quando o mundo aqui fora é caótico.

Outro erro cruel foi criticar o governo federal, mais especificamente o presidente a república, por uma responsabilidade que é do governo estadual. Segurança pública é de responsabilidade do estado, então, o alvo da “revolta” do apresentador global deveria ser o governador José Serra.

A periferia emerge frente aos nossos olhos, ela se manifesta, pulsa, vive, por mais que a ignoremos, pensamos que não passa de algo escondido na sombra de nossa construção social, mas a realidade é que eles desenvolveram um segundo sistema que entra em conflito direto com o nosso. E o pior, eles ficam cada vez mais fortes.

Desenvolveram uma cultura, um linguajar, formas, jeitos, normas que invadem as nossas e quando entram em conflito com nosso sistema, geram o caos.

Pichação; gírias; músicas; vestuário; violência; uma esmola, por favor. Eles nos cercam por todos os lados, eclodem dos bueiros, nas paredes, no trânsito, num almoço, num passeio, na volta ao trabalho, no dia-a-dia, numa tragédia, numa exposição de arte. Todos os dias recebemos o mesmo recado de diferentes formas, só que não percebemos. Huck não percebeu.

Não lhe demos voz, eles encontraram outra forma de se expressar. O ser humano se adapta as diferentes situações e condições que é exposto, condicionado. O cego aprimora seus outros sentidos para que possa se orientar. O mudo desenvolve sinais e aprende aos lábios interpretar. O marginalizado faz o caos para se mostrar.

É assim que é a vida, a miséria grita, só falta eu e você escutarmos. Falta, também, um pouco de vergonha na cara de quem tem influência e poder neste país para que as soluções não se limitem à região dos jardins.

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