sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Só não roube sua ex-mulher

Era uma tarde como outra qualquer, para um desempregado. Meu emprego se foi com a desculpa de sempre; a tal crise econômica, corte de custos, a necessidade de enxugar a folha de pagamento.

Normalmente, perder um emprego não é o fim do mundo. É apenas um saco. São mais preocupações, ansiedades, medos e angústias para colecionar. Até que se encontre um novo emprego para se estressar.

Porém, para alguém que não possuía vinculo empregatício formal – aquelas bobagens que a gente faz para tentar manter seu emprego em uma crise e lhe faz a presa mais fácil na seguinte – ser despedido é como naufragar sozinho no meio do triângulo das bermudas.

Não pensava que, de todos os meus credores, minha ex-mulher seria a mais voraz e cruel. Sem renda, sem seguro desemprego, sem seguro e sem poder pagar a pensão de meus dois filhos. Até a companhia telefônica seria mais compreensível, mas uma ex-esposa não teria piedade.

Tudo bem que a gente faz umas bobagens na vida. Não vou negar que o divórcio foi por minha culpa. Ela tem motivo para estar ressentida, mas não esperava que fosse vingativa.

Engraçado o dia que fui preso. Não fazia idéia do motivo, até que meus carrascos me contaram suas razões. Os arautos da justiça estão atrás do cruel caloteiro das pensões. Afinal, por que correr atrás de quem cometeu um brutal e sanguinolento assassinato, se os terríveis não pagadores de pensão estão a solta!? E eu pensava que o SPC seria meu maior problema…

Não sabia se me indignava ou ria. Era eu tão perigoso para me algemarem? Que risco eu apresentava à sociedade? Qual havia sido meu crime, ser demitido? Minha vontade era chutar o banco do passageiro da viatura. O que de pior poderia me acontecer? Já estava preso por um dos motivos mais ridículos, qual seria o problema de arranjar um de verdade?

Aquelas algemas me irritavam. Eu sempre vi na tevê aqueles bandidos sem rancor algemados. Só de ver alguém de algema eu pensava mal da pessoa. Antes disso, eu pensava que, se estava de algema, o cara estava errado.

Quando antes eu poderia imaginar que por essas bobagens colocariam algemas em cidadãos de bem? Eu sempre paguei meus impostos, nunca cometi crime nenhum. Está bem; ás vezes uma ou outra multa de trânsito, mas isso não é exatamente colocar a vida dos outros em risco, não é?

Ao adentrar a minha cela, senti-me como um cordeiro entregue aos leões. Eu era o almoço após sete dias de jejum.

Por sorte, na delegacia dificilmente eles colocam caras como eu com os homicidas. Claro, os homicidas que eles pegaram cometendo um homicídio. Mas ao meu lado, três rapazes, por volta de 19 anos, que alegavam ser apenas usuários de 900 gramas de cocaína. Porém, ao cair da noite, contavam todos os passos, pontos e lugares para se conseguir drogas. Eu, um pai, um cidadão que nunca havia colocado um cigarro na boca, já sabia como conseguir a droga que quisesse, pelo preço mais barato, com o irmão mais “firmeza”.

Foram três dias até que meu irmão conseguisse regularizar a situação. Se eu fosse patrão, tivesse advogado, tenho certeza, nem teria que dormir na cadeia. Mas a gente faz o que nesse Brasil? Não dá para fazer muito, mas uma coisa eu percebi. Você pode dar calote em qualquer um, desviar verbas públicas e, se for esperto, roubar. Mas não pague sua ex-mulher e… eu garanto; é fatal.

1 comentário:

Michele Sibille disse...

...excelente texto.
verdade, os não-pagadores de pensão são realmente um risco para a sociedade, por que não algema-los? rsrs...
gostei bastante, vou ler outros textos do blog.